Quando eu olho pro lado tem esse vaso. De vidro. Transparente. Redondo. Fica ali distante, não alcanço com os meus braços. Não tem nada dentro. Não é nada, na verdade, não tem significado nenhum, é um vaso, ora, um vaso comum. Não tem nada de mais. Mas é estranho. Não tem lado nenhum. E está me olhando. Um vaso me olhando. Me encarando. Perguntei pro meu irmão se parecia que o vaso estava me encarando, mas ele disse que não. Ainda assim, acho que o vaso está me encarando.
Virei pro lado duas vezes, desvirei, e ele continua me olhando. Por que o vaso está me encarando? Não tem vida, nem cheiro, nem cor tem, é um pedaço de nada, areia derretida e fundida num formato cilíndrico. Poderia até servir pra um propósito, se estivesse com uma flor dentro, um peixe, ou alguma bala. Mas não tem nada. Me pergunto agora porque a empregada colocou ele ali, seco e sem vida, nesse criado-mudo branco sem nada. Só o maldito vaso de vidro que insiste em me encarar.
Eu já perdi a paciência, e se o vaso tivesse paciência, também já a teria como perdida. Eu não vejo propósito algum nesse vaso. Não tem motivo de existir. Seria melhor quebrá-lo e jogá-lo fora. Será? Eu vou me cortar. Então deixa ele lá. Talvez o Atlas caia da prateleira e faça esse favor pra mim. O que fazer então com o vaso? Não sei o que se faz com alquilo que não tem propósito. Sei que se fosse gente já estaria na rua pedindo esmola. Mas é um vaso. Vidro. Caco. A única grandeza que ele ocupa é o espaço. O maldito vaso que me tirou a paz da noite. Já vi que estou perdendo meu tempo olhando pro vaso. Perdendo nada, ele que está roubando de mim, meu tempo, meu sono, meu descanso, não aguento mais essa tortura. Acho que vou dormir. Deixa esse vaso quieto. Não serve pra nada mesmo. Quem sabe um dia ele tome vergonha, e vá fazer alguma coisa de útil na vida? Afinal, vida é uma, e tempo passado é tempo perdido. Até para um vaso de vidro.
Rodrigo Aylmer
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