terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Maia

      Nem se valesse todo o esforço contra o tempo. Já havia acontecido, e ninguém sabe ainda como reverter aquilo o que mais tememos.
      Nem se valesse todos os gritos, todas as frases exclamadas com tanta dor, todo desespero que me fez pela primeira vez em algum tempo não saber o que fazer. Se era apenas a tranca do tempo, esperando a chave da morte para abrir aquela pequena porta, a pequena porta que ela era, não tem mais importância agora. Pra mim apenas parece a maldade do descuido arrancando cada raiz que havia se formado em cada coração dessa casa.
      Nem se valesse todo o socorro que minhas mãos pudessem dar. Ou as de quem fosse, como disse, ninguém aprendeu a esquivar da morte ainda. e eu creio que nunca aprenderão. O máximo que podemos ter é a ilusão de soberania, a ilusão de que nada vai acabar, a ilusão de que tudo é eterno. Como se o tempo não viesse levar tudo o que temos.
      Nem se valessem as lembranças. As histórias que deixaram de acontecer, os carinhos que eu deixei de dar, o amor que não foi suficiente. E agora, como se não bastasse, ainda reside em mim o remorso de saber que eu poderia ter feito alguma coisa. Como se a dor fosse pouca.
Nem se eu tivesse todo o cuidado. É estranho e doloroso sofrer tantas perdas em tão pouco tempo. Cada vez mais amolece meu coração de pedra que se recusa a chorar. A tristeza de ter segurado aquele pequeno corpo, parado, e não saber a resposta certa para aquela situação única, não sobrepõe a certeza do final. Mas o que mais corrói por dentro é que eu sabia que a cachorra iria morrer.

sábado, 14 de janeiro de 2012

Humanos

As pessoas pelas ruas
Com suas preocupações
Suas dores, suas marcas
E suas aflições
Se escondem
Nas sombras dos muros de sangue

E então vão vivendo,
Sem se importar
Com uma adaga na língua
A desfarelar
Os sonhos
Dos que ainda sabem sonhar

Elas vivem como nós
E andam como nós
E respiram como eu respiro
E choram como você chora
Mas o inaceitável é
Que elas somos nós

Nós, que vivemos
E também sonhamos
Sofremos e perdemos
Mas também ganhamos
Nossos planos não vão acabar

Mas também nós, humanos
Nos preocupamos, e nos escondemos
Erramos e desfarelamos,
Com nossas próprias línguas, e dedos
Nós,
Humanos que somos
ou que fomos

Humanos que erramos,
E mentimos,
E erramos,
E estamos rindo
Humanos
Como todos
Capazes
De perdoar
E pedir perdão


Rodrigo Aylmer