segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O Problema Principal

      Foi só olhar pela fresta da porta e ver aquilo que eu nunca tinha reparado. Estava na aula de matemática, com sono, daquele jeito que, qualquer coisa, por mais minúscula que seja, te rouba a atenção. O problema que mais atrapalha é que a mesa em que sento fica colada na porta, quase do lado da maçaneta, e a porta abre de forma que quando aberta, me da uma visão completa do corredor principal do primeiro andar, onde passam todos os alunos para fazer qualquer coisa pela escola.
     Acontece que a maçaneta está com defeito, e a porta não fecha por completo, deixando uma razoável fresta para eu obrservar, enquanto aluno que as vezes se destrai, as bizarrices que a minha escola, como qualquer outra, me oferece.
      Já vi de tudo: tombos, choros, consolos, sermãos, a mais vasta gama de experiências visuais. Houve certo dia- hoje mais cedo- que em mais um de meus devaneios, olhei pela bendita fresta. O que eu vi, não foi uma cena agradável aos olhos comuns. Seria um tanto repugnante. Um menino cadeirante, com a sindrome de... Girando em sua cadeira de roda. Sua síndrome é de modo que seus braços tão deformados, torpes, voltados para fora, parecem estar sempre acenando. Podia ver o sorriso em seu rosto, tambem e não menos deformado, que era como se ele estivesse no paraíso, naqueles momentos em que rodava, rodava e rodava. 
     Não sorria menos o homem que girava o menino, em duas rodas traseiras da cadeira de rodas, que aos meus olhos, parecia ser para eles a maior roda-gigante do mundo. E eles riam inconsequentemente, no que parecia ser um momento de puro êxtase, de exaltação a vida. Porque para o menino, estar vivo era o motivo de viver, e nada mais, apenas a vida bastava a ele. Nem carros, dinheiro, ou brinquedo algum o faria sentir-se mais feliz do que as voltas tontas que dava incessantemente em sua cadeira de rodas.
      E riam-se sem parar, a causar-me inveja de tal alegria. Quantas vezes eu me pego triste, abatido por não ter ganho aquele tênis que eu queria, por não ter ido na festa de fulano, não ter conseguido tal coisa, e o menino, sorria. Ele sorria de felicidade por estar ali. Quantas vezes você fica triste por pequenas coisas fúteis, enquanto está sempre cercado de motivos para ser alegre? Isso me faz perceber que, na verdade, os doentes somos nós.

Rodrigo Aylmer

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